Ir para o conteúdo

Formação em agrofloresta engaja juventude Xavante na restauração de seus territórios

Publicidade.

Nove participantes da comunidade xavante estiveram presentes no primeiro módulo do curso “Compreendendo a Agrofloresta”, realizado entre os dias 18 e 22 de agosto, pela Rede de Semestes do Xingu (ARSX) em parceria com o Instituto Flor de Ibez e a Operação Amazônia Nativa (Opan). Ao todo, serão realizados quatro encontros formativos entre agosto e dezembro de 2023 com o apoio da Rainforest Foundation Norway (RFN).

(Esquerda) Na sombra de uma mangueira, o professor indígena Romildo, o ex-cacique Cirino e o técnico Renato se reúnem para troca de saberes. (Direita) As rodas de canto precedem todas as atividades do dia. (Fotos: Lia R Domingues/ARSX)

Divulgar boas práticas de restauração, contribuir no protagonismo das comunidades e criar espaços de troca entre as aldeias xavantes são alguns dos objetivos do curso. Mas não só, conforme explica Bruna Dayanna, diretora da Rede de Sementes do Xingu: “Estamos promovendo a restauração dos territórios dessas comunidades e queremos fazer isso junto, compartilhando técnicas e apoiando jovens xavantes a se tornarem agentes de restauração também.”

Participantes desenham o que mais lhes chamou a atenção depois de um passeio pelos experimentospermaculturais do Sítio Flor de Ibez. (Fotos: Lia R Domingues/ARSX)

Neste sentido, incentivar a juventude xavante a se capacitar enquanto multiplicadora da restauração é uma estratégia fundamental para a prosperidade das ações nos territórios. “Essas pessoas vão voltar para casa, montar suas experiências e difundir essas boas práticas, adaptando os aprendizados à realidade de cada espaço e comunidade”, complementa Adryan Nascimento, indigenista da OPAN.

Depois de desenhar, cada um apresenta o seu desenho ao restante do grupo. (Fotos: Lia R Domingues/ARSX)

Realizado na sede do próprio Instituto Flor de Ibez, na área rural de Barra do Garças/MT, e ministrado pelo professor Artur Simón, o primeiro módulo da formação reuniu representantes de cinco aldeias distribuídas por três Terras Indígenas (TIs) da Bacia do Araguaia: Paraíso e Ripa, da TI Pimentel Barbosa; Cristo Rei e Mazabizé, da TI Marãiwatsédé, e São Brás, da TI São Marcos.

Algodão/Cepea: Preços oscilam; safra 22/23 pode ser recorde

Entre momentos teóricos e práticos, o encontro incluiu aulas sob a sombra das mangueiras, implantação de canteiros agroflorestais, experimentos permaculturais e rodas de conversa sobre cada território e suas experiências de plantio. Contou, ainda, com a tradução do português para o idioma xavante pelo ex-cacique e fundador da aldeia São Brás, Cirino Hi ‘a ‘u Urébété.

O Sítio Flor de Ibez é um laboratório de permacultura a céu aberto. Nas fotos, o professor Artur Simón (acima, direita) apresenta a agrofloresta do Sítio, enquanto Cirino (abaixo, esquerda) faz as traduções para o idioma xavante. (Fotos: Lia R Domingues/ARSX)

FALAR DE AGROFLORESTA É FALAR DE SAÚDE

Um dos destaques do encontro foi a alimentação, vegana e saudável, coordenada por Elisa Bar-Nissim, cofundadora do Instituto Flor de Ibez, e Maria Ritter. “Os xavantes são muito abertos para uma alimentação diferente. Gosto de pensar que é como se eles estivessem visitando uma outra aldeia. Cada aldeia tem sua alimentação, então no Flor de Ibez nós oferecemos a alimentação que nós mesmos comemos”, explica Elisa.

E, sim, a alimentação é um ponto chave de todo esse processo. Trazer práticas agroflorestais para os territórios indígenas é importante não só pela restauração do solo e do Cerrado, mas também pelo fortalecimento da soberania alimentar e da saúde das comunidades envolvidas.

Participantes observam ramas de mandioca e conversam sobre a melhor maneira de plantá-las. (Fotos: Lia R Domingues/ARSX)

Para Cirino Hi ‘a ‘u Urébété Xavante, que já passou por algumas formações em agrofloresta e hoje implementa roças agroflorestais em sua aldeia, o alimento é um elemento central do bem viver indígena. “Muitas vezes esquecemos nossa vida tradicional e nossa comida saudável. As comidas do waradzu [pessoa não indígena] estão invadindo a nossa saúde com diabetes, depressão, colesterol… Quero trabalhar bastante com roça sem adubo químico e veneno para reduzir as nossas doenças. A minha aldeia tem que ser como modelo para outras aldeias”, conta Cirino.

TRABALHAR JUNTO, PLANTAR TERRA PRETA E MULTIPLICAR A VIDA NO SOLO

Na agrofloresta, todo mundo trabalha junto. As raízes preparam o solo, cheio de vida com a presença de fungos e microrganismos. Ao lado deles, insetos e aves semeiam, adubam e manejam os plantios. Todos são plantadores de floresta. Ao ser humano, cabe aprender a trabalhar em harmonia com essa rede viva e diversa.

Aqui, o trabalho é coletivo: depois de limpar e rastelas as linhas de plantio, é hora de fazer a cobertura do solo e plantar variedades como a mandioca. (Fotos: Lia R Domingues/ARSX)

“Na agrofloresta, usamos mecanismos da floresta para produzir agricultura. O agricultor tem que estar ativo, reduzindo os tempos da natureza. Você pode fazer agrofloresta de muitas maneiras, mas estamos pesquisando uma agrofloresta com a qual você possa conversar. Para isso, é preciso cooperação”, ensina Artur Simón, ministrante do curso e cofundador do Instituto Flor de Ibez, cuja sede – reduzida a pastagens até poucos anos – está sendo recuperada graças ao trabalho agroflorestal.

“A terra, a gente constrói. O trabalho de recuperação começa em trazer vida pro solo. Madeira, folha, formiga, cupim… Todos trabalham pela terra preta, pela terra boa. Construir essa terra foi nossa maior pesquisa neste primeiro encontro. Se você trabalha, você transforma. E este é nosso trabalho: transformar”, conclui o professor.

O professor Arthur Smón apresenta o processo e compostagem dos banheiros secos (que transformam coco em adubo!) e a produção de terra preta a partir do círculo de bananeiras que recebe águas da cozinha. (Fotos: Lia R Domingues/ARSX)

Por Lia Rezende Domingues

Da Associação Rede de Sementes do Xingu (ARSX)

Deixe uma resposta

Role para cima