Opinião – Zoneamento de Mato Grosso: aquele velho estudo não nos serve mais – Por Itamar Canossa
De tempos em tempos um personagem surge para dar uma chacoalhada no Estado e deixar todo mundo alarmado. Assusta produtores rurais, industriais, comerciantes e a classe política como um todo. Um personagem que vem com discurso e narrativa prontos, querendo promover uma grande organização do Estado, determinando o que deve ser feito e onde deve ser feito. Esse personagem que chega com mandos de coronel e verdades reveladas está de novo nos rondando. Desta vez chegou dizendo-se atualizado e renovado, mas a gente enxerga nele “aquela velha roupa colorida”, citando a música da eterna Elis Regina.
Esse personagem é o famoso zoneamento, que foi chamado de “Ambiental” pela Lei 6.938/1981, depois mudou de sobrenome para “Zoneamento Econômico Ecológico”, no Decreto Federal 4.297/2002, e que em Mato Grosso foi rebatizado para “Zoneamento Socioeconômico Ecológico”.
Tão profusa quanto o nome de batismo do tal zoneamento, tem sido a sua tramitação pelo Estado. Entre idas e vindas e voltas e ajustes, já foi emendando e remendado de governo a governo. Gestado desde a década de 1990, foi apresentado na Assembleia Legislativa em 2004, pelo Governador Blairo Maggi, e em seguida retirado sem ter havido debates parlamentares sobre o texto. Depois, retornou em 2008, após revisão, encaminhado ao Parlamento pelo mesmo governador. Após debates, audiências públicas por todo o Estado e alguns substitutivos integrais, foi aprovado pela Assembleia Legislativa o Substitutivo Integral nº 3, devidamente sancionado pelo Governador Silval Barbosa, sendo convertido na Lei 9.523/2011. Logo em seguida o Ministério Público judicializou a lei, tendo sido suspensa por decisão liminar do então Juiz de Direito da Vara de Meio Ambiente.
Como o zoneamento é peça obrigatória, o Governo do Estado tratou de buscar ajustar a situação e, não logrando êxito no Judiciário, convocou-se a equipe interna novamente ao trabalho. Fruto do trabalho da equipe, uma nova proposta vem sendo discutida ainda em esfera administrativa e, atualmente, foi posta à consulta pública.
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Bem, “nova” não é a palavra que mais se adequa à proposta. O que temos é, de fato, aquele “velho mapa colorido” do zoneamento anterior, com uns leves ajustes, mas que olhando de perto não parece nosso Estado.
Um mapa onde há previsão de construção de unidade de conservação integral sobre o traçado projetado de ferrovia e onde há produção de alimentos. Um mapa que determina que não pode haver criação de gado em confinamento, onde há programas nacionais propondo justamente o confinamento em pequenas propriedades com a finalidade de aumentar a produção leiteira e fixação do homem no campo. Um mapa que entende que certas regiões não são aptas para a agricultura tecnificada, mas que estão produzindo grãos com sistema de alta tecnologia. Um mapa que orienta regiões como sendo áreas para agricultura familiar, mas onde estão propriedades de variados tamanhos, inclusive a pequena, como se o problema ambiental residisse no tamanho da área e não no manejo que é feito nela.
O setor entende que é necessária uma organização territorial onde se verifique potencialidades e fragilidades, mas entende também que deve ser levado em consideração todos os avanços tecnológicos para esse diagnóstico. Avanços tecnológicos tanto no que diz respeito aos estudos quanto aqueles referentes ao sistema de produção. Em pleno ano de 2021 não podemos fazer uma análise do Estado olhando para a década de 1980 ou mesmo de 1990.
Foi por esses motivos que o Fórum Agro MT promoveu uma reunião ampliada com a participação de representantes não apenas da agropecuária, mas também da indústria, comércio, municípios e de parlamentares, sobre a qual comentei em um outro artigo (Fórum Agro MT: pela união do setor). Na reunião foi entendido ser necessário a formalização de um documento para ser entregue na Assembleia Legislativa, alertando sobre os problemas contidos na proposta de zoneamento apresentada. E o documento finalmente está pronto. Após estudos, debates, leituras de números do Estado e verificação de impactos aos diversos setores foi constatado aquilo que já se temia.
A preocupação é tanta que a população de algumas regiões do Estado iniciou um processo de demonstração de sua contrariedade, sobretudo nos municípios do Vale do Araguaia e do Vale do Guaporé. Existe a preocupação de inviabilização de municípios, inclusive. Prefeitos questionam o que fazer com a população no caso de aprovação do documento como está, já que a força motriz da economia será inviabilizada.
Nós, do Fórum Agro MT, pelas entidades que o compõem, juntamente com outras entidades que assinam o documento, entendemos ser necessário um reestudo, utilizando novas tecnologias, imagens de satélite em escala apropriada, detalhamentos. Como o zoneamento a ser elaborado foi batizado com a proposta de ser “socioeconômico e ecológico”, que seja construído embasado nesses documentos atualizados, buscando melhoria da condição de vida para nossa população, visando o uso da tecnologia para a produção de alimentos e extração de minérios, promovendo a geração de empregos, abrindo caminho para o progresso dos municípios e para seus moradores sem, é claro, deixar de se preocupar com o meio ambiente e sua conservação.
Assim, e só assim, com uma visão holística do cenário atual e mirando o futuro é que poderemos ter um documento de organização do território que alie o desejo de nossa população quanto ao progresso ao necessário respeito ao meio ambiente. Queremos esse estudo: atual e tecnológico.
Os estudos realizados no passado, com uma tecnologia muitas vezes já obsoleta, não servem para direcionar os rumos futuros de nosso Estado. O mapa apresentado do zoneamento é “aquela velha roupa colorida” que não representa a atual realidade de Mato Grosso. É um estudo do passado e, mais uma vez citando a música da Elis Regina, “o passado é uma roupa que não nos serve mais”.
Itamar Canossa Presidente do Fórum Agro MT e presidente da Acrismat
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